Psicanálise e Instituição – Qual lugar para o Especial?

Uma instituição significa desenvolver uma atuação coletiva para um grupo de pessoas que necessita de um atendimento por uma equipe multidisciplinar. Esta equipe é constituída por um grupo de profissionais especializados de diversas formações e graduações.

Os profissionais especializados, ou os chamados especialistas são assim classificados para atuar de forma específica e não de forma genérica. O especialista significa uma preparação, um estudo e uma formação profissional direcionada.

O que é importante diferenciar é que o fato de ser especializado não os torna “especiais”. Isto representa um grande engodo, confundir o especialista com o “especial”, o que significa muito mais do que um simples jogo de palavras. Pois ser “especial” representa estar em um lugar diferenciado das demais pessoas por um atributo, uma qualidade diferenciada que mais estigmatiza do que qualifica o sujeito. Algumas pessoas dizem que pessoas que realizam este tipo de atendimento são especiais ou terão seu lugar garantido no céu, já dando a entender que este tipo de atendimento representa um fardo ou uma espécie de vocação.

Para as pessoas que carecem de uma intervenção por uma equipe especializada, necessitar de um atendimento especializado não torna o sujeito “especial”. O fato de ter alguma demanda deste tipo não as fazem diferentes por este fato, a qualificação de especial os estigmatiza e os diferencia pelo diagnóstico e não por sua singularidade. Os especiais, considerados anjos e estigmatizados como aqueles que superaram as diversidades de uma condição de deficiência e por outro os profissionais e familiares que são de uma categoria diferente de pessoas por aturar, ou carregar este fardo.

Uma interpretação que apenas demonstra uma outra face do estigma.

Essa percepção, que não é nem um pouco sutil, mas quase grotesca levou a considerar muitas pessoas diferenciadas e excluídas do convívio social, por serem consideradas “especiais” e necessitarem de atendimento por pessoas especiais em espaços e instituições especiais. Não foi por acaso que durante décadas o tratamento em instituições consideradas especiais era feito com parcos recursos e em locais distantes e diferentes do convívio com os demais. Os “especiais” seriam os diferentes daqueles considerados normais, esses com participação do convívio comum, e para que pudessem conviver com os demais tinham que ser adaptados ou normatizados.

O desafio está em atuar em uma equipe com pessoas, sujeitos onde serão reconhecidos e tratados como únicos. Cada um é único, seja o profissional, seja o sujeito e o tratamento a ser dispensado será especializado e não “especial”.

Uma instituição pautada na psicanálise não tem o propósito de normalizar e adaptar os sujeitos aos ideais da sociedade, apesar de este ser o clamor social. Verdade que é algo difícil de sustentar nos dias atuais, com a expansão do discurso capitalista, mas por isto mesmo é extremamente necessário.

Enquanto a instituição é procurada para que acomode aquilo que causa desconforto e enigma ao sujeito e ao social, a psicanálise busca o oposto ao considerar que é exatamente naquilo que incomoda, no não-sentido, no que causa equívoco, onde o sujeito habita e existe a possibilidade de trabalho.

O saber oferecido pela psicanálise permite uma elucidação sobre o funcionamento do ser falante e sobre a modalidade de seus laços sociais, sem estigmatiza-lo. Ou seja, não são alguns que são considerados especiais por ter um atributo que o estigmatiza, mas são todos especiais por serem todos singulares e diferentes em suas singularidades.